Projeto pretende transformar o Campus São Cristóvão em ‘Escola Guardiã da Canela-Preta’
Patrimônio histórico, cultural e genético do Piauí, a galinha caipira Canela-Preta é objeto de um estudo conduzido pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em parceria com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e com o apoio do Instituto Federal de Sergipe (IFS) – Campus São Cristóvão. A iniciativa visa preservar a espécie, valorizar sua utilização na agricultura familiar e consolidar a unidade como uma “Escola Guardiã da Canela-Preta”. A proposta se ancora na ideia de que o futuro da produção de alimentos está em sistemas que unem ciência e tradição, garantindo segurança alimentar e fortalecendo a memória cultural do Nordeste.
Segundo Cristiane Otto de Sá, pesquisadora da Embrapa Tabuleiros Costeiros, o projeto busca aproximar o conhecimento científico dos saberes populares, oferecendo novas possibilidades para a agricultura de base familiar. “O objetivo é unir ciência e tradição para fortalecer a agricultura familiar, garantir segurança alimentar e manter viva uma herança que se renova no sabor da mesa e na memória das comunidades”, explica. Essa perspectiva se soma à visão do professor José Dantas Gusmão Filho, docente do Campus São Cristóvão, para quem a galinha caipira reúne características que a tornam estratégica para pequenos produtores. “Por sua resistência, rusticidade, produtividade e baixa exigência em manejo, ela é uma excelente fonte de alimento e renda, com aplicação em modelos produtivos baseados na agroecologia. É uma raça que está em estudo, podendo ser considerada de corte e postura. De acordo com o criatório Canela-Preta, pode produzir entre 180 e 220 ovos por ano”, acrescenta.
No IFS, a produção da espécie terá uma dupla função: além de colaborar com a preservação da ave, servirá como recurso pedagógico e extensão tecnológica. Para Cristiane, a formação de uma “Escola Guardiã” no campus abre caminho para vivências concretas com os estudantes. “Isso vai permitir a realização de atividades práticas, apoiar a conservação genética da raça e ampliar a difusão de tecnologias para a agricultura familiar”, ressalta. Atualmente, 70 aves estão em fase de recria no espaço denominado *Vitrine Agroecológica*, localizado próximo ao prédio da Didática IV. Dantas Gusmão, responsável pelo projeto na instituição, enfatiza que a iniciativa trará ganhos para a comunidade estudantil, possibilitando vivências pedagógicas em avicultura, participação em projetos de pesquisa e interação direta com pesquisadores, fortalecendo o eixo ensino-pesquisa-extensão do IFS.
Avicultura em crescimento
Os números da avicultura em Sergipe reforçam o potencial do projeto. Dados do Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nordeste (Etene), referentes a 2024, apontam que a criação de galinhas poedeiras registrou crescimento expressivo no estado, com aumento de 11,45% na produção de ovos, colocando Sergipe entre os polos emergentes da avicultura de postura no Nordeste. Mas, para os especialistas, a criação da Canela-Preta transcende análises mercadológicas e envolve a preservação de práticas culturais que dão identidade ao modo de vida regional. “O grande desafio é evitar que raças comerciais, embora produtivas, comprometam a adaptação local e a sustentabilidade do sistema tradicional de capoeira”, alerta Cristiane.
A pesquisadora destaca ainda que a Canela-Preta é parte de uma tradição alimentar profundamente enraizada no Nordeste. “Um exemplo é o pirão de capão, também conhecido como pirão de parida, prato típico que valoriza justamente a galinha criada solta, no sistema de capoeira. A Canela-Preta não é apenas uma ave de grande resiliência: ela é um símbolo da agricultura familiar, do alimento saudável e da memória afetiva”, defende. Ao propor caminhos alternativos para a criação, o manejo e a comercialização das aves em comunidades de reforma agrária e em sistemas agroecológicos, o projeto busca unir preservação genética, sustentabilidade e valorização cultural, mostrando que a avicultura pode ser ao mesmo tempo uma estratégia de produção, uma ferramenta educativa e um instrumento de fortalecimento da identidade regional.



Redes Sociais